Eu era assim.
Tão pequenina e inocente que nem me lembro. Tão perfeitamente ingénua que não dei por isso. Era tão inexperiente, tão além do mundo. Toda a gente me dizia que parecia um elefante de maiot quando usava vestidos cor-de-rosa, toda a gente se assustava com os meus olhos grandes, cor de avelã, toda a gente apertava as minhas mãos bolachudas e as minhas bochechas apetitosas. Toda a gente se ria das minhas brincadeiras inocentes de criança, menos eu que não sabia porque se riam. Todos se riam quando olhavam para mim. Ninguém me disse a verdade. Deixei passar, não percebia. Passou a ser todos os dias, todos os dias se riam de mim. Dos meus vestidos, das minhas mãos, da minha cara. Na escola ficava sozinha rodeada de crianças tão iguais a mim, ou pelo menos eu achava-os iguais. Eles gozavam-me por ser diferente, diziam eles. Até que houve um dia. Houve um dia diferente, ele chegou-se ao pé de mim enquanto eu chorava, sozinha no pátio como sempre, sentou-se ao meu lado e deu-me um beijo no rosto. Limpei as lágrimas e olhei para ele. "Não te preocupes se és diferente, ao menos és especial."
-Ah, mas tu também mudaste muito.
-Ainda bem!
-Podes crfer. Aidna bem que mudámos.
Perfeito.Ainda bem que não somos os mesmos putos dispersos de antigamente.